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Abertura no cenário mais complicado; perdizes bravas na serra

by Miguel F.S.

Sabemos que não é fácil para a maioria encontrar uma zona de caça com perdizes bravas. Alguns “sortudos” alcançam esse feito a custo de muito trabalho – a sorte trabalha-se! – e se então tiverem terrenos propícios para uma caçada à antiga, em linha (e sem esperas, como infelizmente é cada vez mais comum) e com cães.

Contudo, para que no final da jornada se alcance o objetivo pretendido, cumprir o cupo definido – modesto, como dever ser –, há que coordenar a ação da linha de caçadores, tarefa que se complica mais quando se caça em algumas das mais ásperas serranias da nossa Península. Vamos então dedicar este artigo à nossa Abertura às perdizes na serra; caçaremos, todavia, com
calor, com o campo seco como é comum no início do outono e com o desafio de elevar o ritmo de caça como exigem as perdizes nestes terrenos duros. Muitas dificuldades, mas igualmente momentos muito agradáveis, com cenários bonitos de
caçar, perdizes em bando e sempre aguardando a surpresa causada pela saída de um pássaro depois de dobrar um cerro, num “pegote” de mato ou no seguimento de uma guia do nosso cão.

Equipamento ligeiro, que não falte a água (para si e para os cães), cartucheira, espingarda preparada, corpo e mente reinados, porque vamos para a serra atrás de perdizes que exigem dedicação e espírito de sacrifício. Andaremos num permanente “sobe e desce” que a meio da manhã nos vai fazer recordar que o treino devia ter sido mantido durante todos os meses do defeso. Mas se houver perdizes, seguramente vamos ganhar esse alento que já parecia perdido… e nos colocar-nos-emos novamente atrás delas. A serra é o terreno de caça mais indicado para o meio da temporada e até ao fim da época,
precisamente quando temos “fundo” e os nossos cães levam já umas quantas caçadas, o que unido a pássaros mais fortes, com potência nas asas e cores características de perdizes de serra, tornam estas jornadas mais atrativas. Mas temos de considerar a antecipação a este cenário por vários motivos, sendo um deles a única possibilidade de contacto com perdizes autóctones, com bravura e vigor, que arrancam com guizos nas assas de encosta para encosta. Depois desta Abertura podemo-nos dedicar às perdizes em terrenos mais planos e avançado novembro regressaremos à serra.

Organizar a jornada
Toca agora a organizar bem a jornada começando por definir que parcela de território será caçada, avaliar a orografia, o vento e a densidade de caça, e depois definir a pressão a realizar pelo grupo de caçadores. Outro ponto importante; vamos deixar os cães caçar, deixemo-los levantar as primeiras peças às quais não vamos conseguir atirar. Infelizmente, na ânsia de cumprir cupos, há a tendência de “refrear” os cães nestas primeiras jornadas. Não o façamos. O objetivo não será nunca fazer cintos avultados. Recordemos que neste tipo de terreno há que caçar com talento e visão de busca, procurando resultados equilibrados; é melhor pendurar duas ou três perdizes bem caçadas do que disparar a todos os pássaros que levantam, perto
ou longe. Nem queremos espantar caça do nosso território nem deixar peças feridas irremediavelmente perdidas. Duas perdizes caçadas com esforço são uma magnífica recompensa, sabendo que ficam mais para os vários dias de caça da temporada.

Atrás delas ou saber levá-las?
À perdiz brava há que saber manejá-la, com talento, se quisermos caçar algumas como mandam as regras. O bando que estamos perseguindo arranca num primeiro voo encosta abaixo, deixando-nos sem perspetivas de lances durante um par de horas, ou inclusive metade da jornada. Nos terrenos planos o arranque de um bando não representa tanto tempo até novo contacto com a caça. Na serra significa perder o contacto durante uma boa parte do dia, isto se não conseguirmos uma reação rápida. Ritmo certo e pressão constante para mexermos caça na serra; podemos acabar esgotados a meio da manhã ou mesmo sem possibilidade de tiro a qualquer peça…

Então coloca-se a questão: devemos ir atrás delas, ou tentar levá-las para onde queremos? A resposta equilibrada está talvez
na chave da jornada, e essa resposta está condicionada por diversos fatores; o nosso conhecimento do terreno, a nossa reparação física e mental, a preparação dos cães, a dureza do terreno, a presença de outros grupos de caçadores (a avaliar
nas zonas de caça municipais), o calor, etc. São vários os fatores que marcam o nosso desempenho nesta caçada.

Em primeiro lugar devemos avaliar o terreno de caça e os riscos que podemos ter de ficar sem perdizes perante uma má estratégia, isso é crucial. Igualmente, há que tentar conhecer o comportamento das perdizes nessa zona perante a pressão
de caça, para assim podermos avaliar como lhes entramos de modo a colocar algumas a tiro. Insisto, que embora com comportamentos mais ou menos parecidos, a perdiz autóctone de serra tem querenças muito próprias. Em terrenos duros, com fortes pendentes, as perdizes vão sempre deixar-nos fora de lugar, salvo em lances pontuais que ocorrem habitualmente
já bem depois do meio da manhã. Para as perdizes fazerem uma arrancada ladeira abaixo, apearem até à próxima encosta e
voarem para o próximo cabeço é fácil. E para nós, acompanhá-las é muito complicado, por vezes impossível e na maioria muito exigente, sobretudo quando levamos muito tempo entre cada contacto com a caça. Se apostamos em ir para onde
elas nos querem levar
, segui-las com paciência, boas pernas e tentar acudir rápido ao arranque do bando, é a nossa única opção. Há terrenos que nos permitem fazer alguns tiros, principalmente a pássaros novos que ficam “soltos” ou se “estancam” num rodal de mato ou junto de um penedo tentando passar despercebidos. Aí há que estar em forma, muito bem preparado,
não hesitar das decisões e ter um cão bem metido na caça, caso contrário não a vamos pendurar.
Outra opção é tentar conduzi-las com um bom movimento da linha, procurando interpretar o que elas querem fazer para assim poder reagir a tempo. É igualmente um trabalho muito exigente, mas nestas primeiras jornadas, se estamos bem preparados, podemos conseguir pendurar algumas das peças que vão despegando do bando à base de pernas, pressão constante e, sobre tudo, a passar nos “pontos sensíveis” onde pode estar uma perdiz amagada. É relativamente fácil que
depois de “mexer” o bando em vários voos (tentando não pressionar a caça nas piores zonas para que não ganhem terreno difícil de recuperar), recortar-lhes nas subidas e levá-las em zigzag – para cansá-las –, se consiga encontrar algumas
perdizes amagadas, principalmente nestes dias quentes de outubro, chegando inclusive a permitir o levante perto dos nossos cães.

Duras, duríssimas
Como o terreno onde habitam, estas bravas perdizes de serra, que nos atraem pela beleza do terreno e que nos desesperam literalmente se a nossa estratégia ou preparação não são adequadas. As perdizes de serra não estão ao alcance de todos os caçadores, alguns por não contarem com a necessária preparação física, pelo imperativo da idade, por exemplo, ou outros por falta de mentalidade, espírito de sacrífico e até mesmo pela capacidade em se conformarem com a derrota e voltarem para casa de cinto vazio, por vezes literalmente vazio, sem cartuchos nem caça pendurada…

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