Quando temos a árdua tarefa de treinar um cão jovem, todos, absolutamente todos, vamos cometer alguns erros. Claro que a base do conhecimento, unida com a experiência, vão minimizar muitos desses riscos, mas sobretudo tornarão esses erros conscientes. Há erros conscientes? Claro que sim. Como podemos falhar conscientemente? Estaríamos loucos. O que fazemos é dar-nos conta de que falhamos, mas não o fizemos de propósito.
Muitas pessoas não entendem o esclarecimento que acabo de fazer, pois pensam que qualquer um pode treinar um cão: “tive cães durante toda a minha vida”, “caço desde os meus oito anos”, “tenho mão para lidar com os cães”… Há uma linguagem canina que se não se explica, não a vamos entender; há uma psicologia, um estudo da conduta e umas metodologias que requerem estudo, formação e, posteriormente, experiência. Obviamente que a experiência se vai adquirindo, mas deve ser sempre acompanhada de uma base formativa, porque se for de forma contrária, vamos treinar um cão e cometeremos erros inconscientes, daqueles que nem sequer damos conta que estamos a cometer porque nos falta uma base formativa, volto a repetir.
Que erros são esses?
Não premiar corretamente: é o erro mais comum entre a maio ria das pessoas, que não percebem o que é um condicionamento através de prémios ou castigos. Acreditam que um prémio é somente dar biscoitos ou salsichas, mas não são capazes de premiar com um “muito bem” cada vez que o cão obedece ou que a sua conduta é desejável: “Sim recompenso, levo sempre biscoitos no colete”, e esta última frase abarca um segundo erro muito comum… Para caçar vamos já com os “trabalhos de casa” feitos. Não devemos levar prémios no colete amigos; os prémios devem estar condicionados antes de irmos caçar. Trabalhamos a chamada com comida + “muito bem”, e dessa forma condicionamos uma associação do “muito bem” = salsicha ou biscoito, e no futuro podemos deixar a comida em casa e premiar só com “muito bem”.
E o que é que acontece se não premiarmos corretamente? Pode mos enganar o cão, ou seja, fazemos o bem para o mal, poderemos traduzir assim. Precisamos de muito mais repetições ou não associará correta mente aquilo que pretendemos, mas sim qualquer outra coisa. Por exemplo, se o chamamos e não premiamos com a voz, somente com a comida quando chega; quando deixarmos de utilizar os prémios de comida, o cão deixará de obedecer, é a lei da conduta animal: “a ausência
de prémio provoca a extinção de uma resposta”. Premiando prejudicamos a paragem: certamente já leram milhares de vezes coisas que escrevi sobre isto, pois é o prémio inconsciente por excelência. Se disparamos sobre uma peça que o cão não parou, estaremos a premiar essa conduta, a conduta de não parar, espantar, carregar, e há outra lei animal que diz: “qualquer conduta premiada tende a repetir-se”. Portanto, o cão voltará a espantar e não a parar, pois foi aquilo que o ensinamos. Obviamente que vai depender de cada cão, alguns precisam de repetir várias vezes para associar, mas outros precisarão apenas de uma única vez, asseguro-vos, porque já o vi. Carregar, sem parar sobre a peça e o caçador matá-la, quer dizer que
irá precisar de muito trabalho para recuperar a paragem nesse exemplar.
Não castigar corretamente
Também podemos falhar de forma inconsciente ao castigar. Se desconhecemos as sensibilidades físicas ou auditivas do aluno, vamos falhar inconsciente mente, pois passaremos o limite ou não conseguiremos e se isto acontecer, o castigo é inútil ou, pior ainda, pode estragar de vez um cão e então, acabou-se. A grande maioria dos problemas no cobro deriva de um castigo inconsciente. Não percebem que quando perseguem um cachorro que está orgulhoso com a sua codorniz, o seu troféu, para ele é uma luta e vocês são competidores. E se a roubarem, passam a ser o rival, e se forçam para conseguir tirá-la da boca e até o magoam, estarão a castigá-lo, e o cachorro pode entender como que não querem que ele cobre e vos entregue a peça.
Porque é que vai perceber isso e não que me deve trazer a peça? Porque não construíram o exercício, não souberam premiar corretamente, não condicionaram o prémio com a conduta do trazer, e ainda por cima castigaram; não testaram as sensibilidades físicas do cachorro; ou seja, falta-vos formação base. Menciono muito as sensibilidades, quer físicas, quer auditivas, devido à sua importância. Não conheço ninguém que tenha criado o medo aos tiros no seu cão de forma consciente; todos cometem esse erro inconscientemente. A maioria das vezes dão-se conta depois, quando lhe explicam, quando dizem que o cérebro do cão é associativo, que devemos procurar sempre uma associação positiva, com qualquer coisa que façamos, para não arriscar.
APONTAMENTO FINAL
Este é o grande segredo, amigos, não arriscar. Quando nascessem, os cães deviam trazer estas duas palavras pintadas no lombo, e deviam lá permanecer pelo menos durante o seu primeiro ano de vida, porque há caçadores que cegam com a caça, como bons predadores que são, mas não percebem que antes de caçar há que educar; e caçando não se educa. O nosso tio, avô, pai… não nos advertiu para isto, quando deram o primeiro tiro, quando eram crianças? Eles atiraram primeiro à peça de
caça e pediram-nos desculpa por fazê-lo e não avisarem. O problema é que os cães não entendem as desculpas. Um cão não entende quando falamos com ele, e por isso não podemos advertir, mas sim criar uma associação positiva do tiro.