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Vamos saber mais sobre… Passo das estrias

by Pedro Vitorino

Passei cerca de três décadas da minha vida como aficionado da caça maior e do tiro à bala sem praticamente ouvir falar do “passo das estrias” de um cano. Agora vejo que este é tema de conversa frequente, inclusive para quem compra a sua primeira carabina. Será que precisamos de saber assim tanto sobre o passo das estrias do cano de uma carabina?

Texto: Pedro Vitorino / Fotos: Autor e arquivo Caça & Cães de Caça

Perdoem-me pela pronta resposta, mas a verdade é que para caçarmos pouco ou nada precisamos saber sobre o passo das estrias do cano da nossa carabina. Acreditem, não estou a minimizar o tema, nem sequer a tirar importância aos sulcos que existem na alma do cano das armas que disparam projétil único de munição metálica. As estrias fazem falta e têm um único objetivo!

Os “varões” em aço prontos a serem trabalhados e o exemplo de um deles saído da máquina.

PARA QUE SERVEM AS ESTRIAS?

As estrias da alma do cano de uma carabina têm como propósito estabilizar a bala (ou projétil, como queiramos chamar), fazendo com que a mesma se mantenha na sua trajetória sempre com a ponta para a frente. Ao se imprimir uma rotação elevada à bala, a sua perda de velocidade resultado do atrito aerodinâmica é superior à perda da rotação, por isso vai continuando de “bico” para a frente na sua trajetória.

A relação entre a profundidade do sulco e o passo das estrias nada tem que ver com o calibre em si, mas sim com o tamanho (comprimento) das balas; quanto mais longa é a bala, mais apertado será o passo das estrias para conseguirmos o desejado efeito estabilizador.

A profundidade das estrias será uma opção do fabricante em função do uso a que se destina a arma. Por exemplo, uma carabina que se destine ao tiro de competição, sujeita a maior número de disparos num curto período, deverá ter estrias com uma maior profundidade. O mesmo será válido para uma arma de uso militar.

A máquina de martelagem a frio. Os varões de aço não são furados, mas sim martelados com uma ferramenta que arromba o material (aço).

NÃO COMPLIQUEMOS

Durante a minha vida como jornalista deste sector tive oportunidade de partilhar experiências e ouvir verdadeiros mestres nestes assuntos de balística, autores de inúmeros artigos em prestigiadas publicações sobre armas, munições e caça na América do Norte e Europa. Com eles fui aprendendo, ouvindo, lendo e perguntando. Felizmente fui tendo muitas oportunidades.

Quase todos os colaboradores dessas publicações norte-americanas são pessoas muito experientes, a maioria deles colaboram com os principais fabricantes de munições, no desenvolvimento de novos projéteis ou cargas. No Velho Continente tenho os nórdicos como referência, um par deles tornaram-se verdadeiros amigos, caçamos juntos e levaram-me a conhecer “por dentro” uma das fábricas de munições com maior prestígio na Europa.

Aprendi tanto com os norte-americanos como com os nórdicos que não devemos complicar aquilo que não é complicado. A parte da balística que nos interessa, para caçarmos, é toda aquela que fica fora do cano, portanto, sem estrias! Devemos saber como se comporta o projétil na sua trajetória e qual o seu efeito terminal. É só isto.

Em cima a ferramenta que irá avançar no varão de aço e abrir as estrias, podendo-se ver ainda as várias fases de acabamento do que será o cano.

PADRÕES

Muito bem, mas já sabemos que as estrias estão lá (dentro do cano) e fazem falta. Também podemos saber um pouco mais sobre elas (as estrias), até porque saber não ocupa lugar, dizem.

Portanto, já sabemos que as estrias servem para estabilizar a bala, conseguindo-se uma precisão muito maior com projétil único num cano de alma estriada do que com um cano de alma lisa. Fácil de perceber.

A fórmula para determinar a correta estabilização do projétil e, consequentemente, o passo das estrias, considera o comprimento, o peso e a forma (design) do projétil. Destes três pontos, o mais importante é o comprimento do projétil, ou melhor, a sua superfície de contacto com as estrias.

O passo das estrias é definido numa expressão que nos indica o comprimento por uma volta completa; por exemplo, 1:10, significa 1 volta (rotação) em 10 polegadas. Alguns fabricantes europeus indicam o passo das estrias em milímetros, portanto 1:254, será 1 volta (rotação) em 254 milímetros.

Aqui já podemos vislumbrar o que será um cano…

UM EXEMPLO; CALIBRE .30

Talvez a forma mais simples de explicar a diferença entre passos das estrias seja pegar no calibre .30, até porque é dos mais utilizados entre nós – .308 Win. / .30-06 / .300 Win.Mag. É a melhor – e mais simples explicação – que encontrei até hoje, vi-a num dos artigos do norte-americano Craig Boddington.

Atualmente temos fabricantes que fornecem as suas carabinas nos calibres .30 que referi acima, com passo das estrias entre 1:10 e 1:14. Estes calibres têm uma das mais amplas ofertas de projéteis, tanto na forma (ponta romba, ponta “Spitzer”, FMJ, etc.) como no peso. Podemos encontrar munições no calibre .308 Winchester entre 110 e 220 grains e se formos adeptos da recarga ainda temos a opção de “pontas” com 100 ou 250 grains. Não será razoável esperar o mesmo comportamento em termos de precisão de tiro com o mesmo passo para todos estes projéteis. Por isso mesmo, alguns fabricantes que produzem modelos para uma função bastante específica, por exemplo, disparar balas subsónicas (grandes e pesadas) ou, pelo contrário, projéteis muito mais leves para caça “varmint”, e optar por passos das estrias de 1:12 ou 1:8, respetivamente.

CONCLUINDO…

Penso que facilmente chegamos à conclusão de que os fabricantes quando lançam uma arma de caça estão a pensar precisamente numa utilização ampla, mas padronizada das munições que existem no mercado. Apenas aqueles que pretendem se dedicar a algo muito específico, como tiro de competição, e assim determinar as condições particulares dessa modalidade se devem preocupar com o passo das estrias. Em vez disso, talvez não seja má ideia preocuparem-se com o “estado” das estrias… mas isso fica para outra altura.

Alguns passos de estrias

Em função do tipo de utilização e do calibre, os fabricantes produzem os canos das suas carabinas com os passos de estrias que consideram mais versáteis e assim possibilitarem ao utilizador final – o caçador, no nosso caso – optarem por um vasto amplo leque de munições sem comprometer aquilo que é aceitável em termos de precisão. Eis alguns exemplos dos passos de estrias de armas que encontramos no nosso mercado.
FabricanteModeloCalibreComprimento do cano (cm)Passo de estrias (polegadas)
BERGARAB14 Crest.243 Win.511:10
6,5 CM511:8
6,5 PRC511:8
.308 Win.511:10
.300 Win.Mag.611:10
BLASERR8.308 Win.diversos1:11
.30-061:11
.300 Win.Mag.1:11
BROWNINGA-Bolt 3+.243 Win.561:10
.308 Win.531:12
.30-06531:10
X-Bolt.300 Win.Mag.611:10
WINCHESTERXPR Long Range.308 Win.531:10
6,5 CM531:8
XPR Stealth.308 Win.531:12
.30-06531:10
.223 Rem.531:8

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